Melissa Crocetti
Esses dias um baixista – um excelente baixista, diga-se – estava aqui em casa. A gente conversava sobre o Sandbox, do Mark Sandman, e ele começou a me contar por que o Sandman resolveu deixar o baixo com apenas duas cordas e fazer meio que uma revolução no instrumento na época. A história é mais ou menos a seguinte. Sandman era um guitarrista na essência, tanto que a forma como ele tocava baixo, a posição da mão nas cordas, era de quem tem familiaridade com guitarra. Só que ele se apaixonou pela sonoridade grave do baixo e resolveu fazer do Morphine uma banda com baixo de duas cordas, modelo fretless, além do sax e da bateria. Assim conseguia um som único, limpo, ‘mais fácil’ e sem intromissões desnecessárias. A mim, parece mais intenso e melancólico.
A minha paixão por Morphine é antiga. Gosto de todos os discos da banda. Admiro a poesia, a perfeição da harmonia. Sou viciada na voz de Mark Sandman, preciso dela para que as coisas tenham mais sentido e a vida seja mais bonita. Cure for Pain, segundo disco da banda, de 1993, é mais importante do que os outros porque é a trilha sonora perfeita para todos os momentos, sozinha ou acompanhada, feliz ou pessimista. A música que dá nome ao disco diz: Where is the ritual/ Where is the taste/ Where is the sacrifice/ Where is the faith/ Someday there’ll be a cure for pain/ and that’s the day I throw my drugs away/ Where is the cave/ Where the wise women went/ and where’s all the money that I spent?/ I propose a toast/ to my self control/ See it crawling helpless on the floor.
Não é à toa, provavelmente, que uma vez ouvi dizer que o Morphine foi eleita a banda mais sexy dos anos 90 (desculpem-me, mas apesar de ser jornalista, nesse caso não estou à procura de confirmação de fatos. Pode ser que sim, pode ser que não, mas como gosto incondicionalmente, isso virou a verdade). Acredito que ele, o Sandman, fez durante a vida uma ode às mulheres e me incluo entre elas. Acredito que ele era um cara romântico sem ser piegas. Acredito que ele nem sofria tanto quanto cantava que sofria. Acredito que ele teve muitos casos amorosos e que os nomes femininos de inúmeras músicas são os nomes delas. Acredito que ele foi um cara bacana que gostava de olhar o que estava acontecendo em volta. Acredito que ele encontrava a cura para a dor na música. E pra mim isso basta.
Acho que o nome Sandman tem ligações ocultas e fantásticas com o personagem imortalizado por Neil Gaiman na série homônima, assim como na minha cabeça há ligações, e talvez já tenham feito teses acadêmicas sobre isso, entre Morphine, morfina, Morpheus (deus do sono) e os quadrinhos dos Perpétuos. Como o Mark já morreu – em 99, no palco enquanto cantava –, continuo pensando em como que ele chegou nisso tudo, sem a mínima intenção de achar a resposta. Para mim, Cure for Pain faz parte de um ritual: abrir as janelas, apagar as luzes e deitar no chão para sentir a música. Talvez isso faça dele o álbum mais importante da minha vida.
Melissa Crocetti é jornalista e trabalha para a View Editores, em Curitiba. Gosta de livros (Henry Miller, Fante, Bukowski), fotografia (Diane Arbus, Trent Parke), música (Morphine, The Clash, PJ Harvey), pretende ter uma editora e ser vocalista de uma banda de rock. Este texto foi produzido para uma série da Revista Etcetera.
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Esses dias um baixista – um excelente baixista, diga-se – estava aqui em casa. A gente conversava sobre o Sandbox, do Mark Sandman, e ele começou a me contar por que o Sandman resolveu deixar o baixo com apenas duas cordas e fazer meio que uma revolução no instrumento na época. A história é mais ou menos a seguinte. Sandman era um guitarrista na essência, tanto que a forma como ele tocava baixo, a posição da mão nas cordas, era de quem tem familiaridade com guitarra. Só que ele se apaixonou pela sonoridade grave do baixo e resolveu fazer do Morphine uma banda com baixo de duas cordas, modelo fretless, além do sax e da bateria. Assim conseguia um som único, limpo, ‘mais fácil’ e sem intromissões desnecessárias. A mim, parece mais intenso e melancólico.
A minha paixão por Morphine é antiga. Gosto de todos os discos da banda. Admiro a poesia, a perfeição da harmonia. Sou viciada na voz de Mark Sandman, preciso dela para que as coisas tenham mais sentido e a vida seja mais bonita. Cure for Pain, segundo disco da banda, de 1993, é mais importante do que os outros porque é a trilha sonora perfeita para todos os momentos, sozinha ou acompanhada, feliz ou pessimista. A música que dá nome ao disco diz: Where is the ritual/ Where is the taste/ Where is the sacrifice/ Where is the faith/ Someday there’ll be a cure for pain/ and that’s the day I throw my drugs away/ Where is the cave/ Where the wise women went/ and where’s all the money that I spent?/ I propose a toast/ to my self control/ See it crawling helpless on the floor.
Não é à toa, provavelmente, que uma vez ouvi dizer que o Morphine foi eleita a banda mais sexy dos anos 90 (desculpem-me, mas apesar de ser jornalista, nesse caso não estou à procura de confirmação de fatos. Pode ser que sim, pode ser que não, mas como gosto incondicionalmente, isso virou a verdade). Acredito que ele, o Sandman, fez durante a vida uma ode às mulheres e me incluo entre elas. Acredito que ele era um cara romântico sem ser piegas. Acredito que ele nem sofria tanto quanto cantava que sofria. Acredito que ele teve muitos casos amorosos e que os nomes femininos de inúmeras músicas são os nomes delas. Acredito que ele foi um cara bacana que gostava de olhar o que estava acontecendo em volta. Acredito que ele encontrava a cura para a dor na música. E pra mim isso basta.
Acho que o nome Sandman tem ligações ocultas e fantásticas com o personagem imortalizado por Neil Gaiman na série homônima, assim como na minha cabeça há ligações, e talvez já tenham feito teses acadêmicas sobre isso, entre Morphine, morfina, Morpheus (deus do sono) e os quadrinhos dos Perpétuos. Como o Mark já morreu – em 99, no palco enquanto cantava –, continuo pensando em como que ele chegou nisso tudo, sem a mínima intenção de achar a resposta. Para mim, Cure for Pain faz parte de um ritual: abrir as janelas, apagar as luzes e deitar no chão para sentir a música. Talvez isso faça dele o álbum mais importante da minha vida.
Melissa Crocetti é jornalista e trabalha para a View Editores, em Curitiba. Gosta de livros (Henry Miller, Fante, Bukowski), fotografia (Diane Arbus, Trent Parke), música (Morphine, The Clash, PJ Harvey), pretende ter uma editora e ser vocalista de uma banda de rock. Este texto foi produzido para uma série da Revista Etcetera.
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