quinta-feira, 30 de abril de 2009

Nos trilhos do atraso

Foto: Renato Larini



Flávio Jacobsen

Sozinho por Londres, numa rara tarde de céu azul, tomei o “busão” vermelho de dois andares, clássico. Depois, o metrô até a estação Waterloo a fim de fazer uma conexão.

Enquanto esperava o meu trem, lendo o Times, ouço uns turistas conversando ao lado. O que deu pra entender foi uma senhora contando a eles que aquela estação é de 1854. Conferi a informação. É isso mesmo. 153 anos! E não é a única da mesma idade. Há várias, de quando os ingleses inventaram o Underground.

Certo que, no período vitoriano, a Greater London já contava com 6 milhões de habitantes. Carroça pra todo lado. Infernal. O transporte por debaixo do solo foi uma necessidade e uma solução radical, que não veio sem qualquer contestação. Foi preciso muita discussão às margens de um Tâmisa ainda fedorento, até que os homens aprovassem as medidas que levariam ao início das obras.

Hoje são 268 estações e aproximadamente 400 km de trilhos, servindo 10 milhões de pessoas. Somente em Londres, fora o restante do país. Mal comparando, a cidade de São Paulo com seus 15 milhões de habitantes não conta com 70km.

Tudo me veio à mente por lembrar no ato de um Brasil que, até a minha infância, contava com trens que o ligavam praticamente de norte a sul. Eu vinha de Santos ao norte do Paraná de trem, feito um Pedrinho rumo ao Sítio do Pica-Pau Amarelo.

O problema é este. O Brasil já teve trens. Dá pra dizer que este país só é o que é por ter contado com trens um dia. E digo que o Brasil não é o que poderia ser porque um dia acabaram com os vagões de passageiros. O país saiu dos trilhos.

O trem já nos deu obras-primas. Dos gols de Pelé ao Trem das Onze de Adoniran. Sim, o futebol surgiu no Brasil pelas mãos de Charles Miller (filho de pai ferroviário), que trouxe a bola da Inglaterra. Então, sem o trem não haveria a primeira bola. Sem a bola, nada de Pelé. E nada do corintiano Adoniran, que não poderia ficar nem meio minuto com você.

Até na primeira página do Dom Casmurro, lá está o trem, com Bentinho indo trabalhar. O velho Machado tremeria no túmulo, ao ver onde chegamos.

Por estes dias paira no ar a conversa da criação do metrô em Curitiba. E vejam o futebol aí, de novo. Muitas cidades brasileiras poderão vir a ter o seu metrô construído ou ampliado, graças a uma exigência da Fifa para a Copa do Mundo. É por aí que as coisas vão.

Às margens do rio Belém, homens planejam tudo. Ao longo dos anos a estação de trem transformou-se em um shopping. Agora, é preciso uma estação para o metrô e ... Bem, deixa pra lá, ó pá.

Pelo que andei sabendo sobre o que virá a ser o sistema, vão eliminar as linhas de ônibus expresso para o trem passar subterrâneo. Bem, o “expressão” ainda funciona a contento no transporte da cidade. Sei não. Vão escavar tudo e no fim fazer um metrô pinga-pinga para parar praticamente nos mesmos pontos.

Dizem que é pra liberar o trânsito. Isso é balela. Em Londres mesmo, o trânsito é uma porcaria. Sem as carroças dos tempos da rainha Victoria, é verdade. Mas é horrível. De lugares que não conheço, e com ótimo sistema de trens como Nova Iorque e Tóquio, ouço falar a mesma coisa.

A diferença é que o cidadão tem a opção. Quer ter um carrão? Fique aí por horas no conforto do seu possante. Quer chegar mais rápido? Vá de trem.

Da Waterloo desci na Picadilly Circus, e fui tomar uma guiness num lugar qualquer. Na paisagem das ruas do Soho, por detrás do vidro do pub notei os mesmos turistas passeando faceiros entre os michês e prostitutas do lugar. A pé. Bacana.

Folha de Londrina – 13/03/2009

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Bom feriadão!

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Onze heróis e 22 mil guerreiros

Aqui!

Atlético quebra a invencibilidade do Corinthians!

Campanha da torcida atleticana no fim dos anos 60.

Atlético 3 X 2 Conrinthians

Eu só quero o título domingo!
E a vaga quarta-feira!
Cês vão vê como eu me vingo
Tô sem êra nem bêra...


Paixão - Gazeta do Povo
Deu na Gazeta:

Nietzsche , o eterno retorno e o futebol

Cristovão Tezza

No último domingo, pela manhã, deixei prontinha uma bela crônica falando sobre Nietzsche, a teoria do eterno retorno e sua relação com o futebol – e, é claro, a vitória espetacular do Atlético sobre o Coritiba, o que já teria lhe garantido a taça por antecipação. Imaginei entrevistas alegres e calorosas no final do jogo, antecipei a festa aqui em casa e a comemoração com os vizinhos. Fiquei calculando até o que ia dizer ao dentista coxa-branca, que, um ano atrás, usou a broca como vingança, enquanto eu, amarrado na cadeira, não podia responder.
Texto pronto, feliz da vida, foi só abrir a cerveja e esperar o jogo. Bem, antes de falar da partida vou retomar um pouco o paralelo que tentei fazer, mesmo com a cabeça inchada – e não mais de cerveja. O filósofo Nietzsche esboçou o conceito de “eterno retorno”, que, numa síntese leiga, é a ideia de que a vida repete sempre os mesmos fatos e sensações e essa repetição eterna nos limita. Talvez uma boa explicação didática possa ser encontrada no futebol, já que as partidas não funcionam como entidades isoladas – aliás, ninguém dá bola para amistosos. O que interessa mesmo é a cadeia dos campeonatos, a dura sequência de jogos em que se contam pontos para a vitória final. O ciclo dos torneios tem assim o poder de controlar o tempo, medi-lo e organizá-lo em temporadas que eternamente se repetem. Porque, também no futebol, a vida continua e, conforme a surrada mas sempre útil sabedoria popular, nada como um dia depois do outro.
No ano passado, o Atlético ganhou o jogo e perdeu o campeonato. Neste ano, perdeu o jogo, mas pode ganhar o campeonato. Aliás, tenho certeza absoluta de que vai levantar a taça, depois de um longo tempo de sofrimento – é a lei do eterno retorno, misturando um pouco a teoria do filósofo com o desejo do torcedor. Mas, como nada é fácil, ainda teremos de encarar amanhã o Corinthians de aperitivo, que vem embalado com o gol do Ronaldo – por falar em eterno retorno –, o gol mais bonito dos últimos tempos. E na Copa do Brasil cada partida é uma batalha quase irremediável. Pode ser o grande momento para o Atlético se centrar, um momento épico (como aliás o momento que os coxas devem ter vivido domingo passado). Sinto que a equipe parece sempre cair mais por falta de equilíbrio emocional que por carência técnica, e transparece ainda uma indecisão sobre qual é afinal a formação titular do time. O problema é que no futebol parece que todos os santos são de barro, e é para eles que temos de rezar e sofrer durante o jogo. E vejam só, pessimistas: continuamos em primeiro lugar.
Pois eu ia comentar o Atletiba. Mas com o espaço chegando ao fim, melhor dizer das vantagens do romancista sobre o cronista. Aquele cria a realidade; este se arrasta atrás dela, escravo fiel. E a realidade digamos que está mais à frente, domingo que vem, quando se fecha um ciclo.

Cristóvão Tezza é escritor